Qual o termo inicial do prazo de 120 dias para que o candidato impetre Mandado de Segurança questionando a validade de cláusula ou regra contida no Edital de abertura do certame?
Durante muito tempo, a jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça sinalizava que o prazo já começaria a contar a partir da data de publicação do Edital. Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CURSO DE FORMAÇÃO. SOLDADO/PM. REGRAS DO EDITAL. LIMITAÇÃO DE IDADE. TERMO INICIAL. DATA DE PUBLICAÇÃO DO EDITAL. DECADÊNCIA CONFIGURADA. AGRAVO DESPROVIDO.I - A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que a publicação do edital é o termo a quo para a impetração de mandado de segurança destinado a impugnar exigências fixadas para a realização do concurso público. II - Agravo interno desprovido (STJ, AgRg no Resp 1161988, Rel. Min. Gilson Dipp, p. 22/11/2010)DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. REGRAS DO EDITAL. CIÊNCIA DO ATO IMPUGNADO. DATA DE PUBLICAÇÃO DO EDITAL. DECADÊNCIA CONFIGURADA. NOTA OBTIDA NOS TÍTULOS. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. NÃO CONHECIMENTO DA INSURGÊNCIA. PROVA ORAL. OFENSA AO PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE. INEXISTÊNCIA. RECURSO IMPROVIDO.1. O Superior Tribunal de Justiça firmou compreensão segundo a qual o prazo decadencial do direito de impetrar mandado de segurança começa a fluir da data da publicação do edital do concurso público quando o candidato se insurge contra as regras contidas em referido instrumento convocatório (...) (STJ, RMS 27673, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, p. 02/08/2010)
Era o tal do “fale agora, ou cale-se para sempre”.
Contudo, recentemente, o Supremo Tribunal Federal, em decisão proferida no julgamento do AgR no MS n. 29874, Rel. p/Acórdão Min. Gilmar Mendes, debruçando-se sobre o tema, decidiu que o prazo decadencial de 120 dias deve ser contado a partir do momento em que a cláusula ou regra possa causar prejuízo (=ser aplicada) ao candidato, e não a contar da data de publicação do Edital.
Confira-se:
Agravo em mandado de segurança. 1. Concurso Público. 2 Impetração contra a eliminação do candidato na fase de Teste de Aptidão Física, que se aponta como ilegal. 3. Preliminar de Decadência. Termo inicial do prazo decadencial: data do efetivo prejuízo capaz de configurar violação a direito líquido e certo – no caso, eliminação no Teste de Aptidão Física. 4. Decadência afastada para determinar o prosseguimento do writ. Agravo a que se dá provimento
Em atenção à orientação do Supremo Tribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça começou a rever a sua posição antes consolidada, a saber:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DO AMAZONAS. ART. 535 DO CPC. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. EDITAL. EXIGÊNCIA DA COMPROVAÇÃO DE DOIS ANOS DE EXPERIÊNCIA ANTES DA POSSE. ELIMINAÇÃO DA CANDIDATA. DECADÊNCIA DO MANDAMUS. NÃO OCORRÊNCIA. TERMO INICIAL. MOMENTO EM QUE O ATO COATOR SE TORNA EFICAZ. (...) 3. Não configura ato coator a exigência que, no momento da publicação do edital, não fere o direito líquido e certo da candidata, detentora, tão somente, da mera expectaticva em ser aprovada. 4. O termo a quo para a fluência do prazo decadencial é o ato administrativo que determina a eliminação da candidata, e não a mera publicação do respectivo edital. Precedentes. (STJ, AgRg no Resp 1261679, Rel. Min. Castro Meira, p. 10/11/2011).
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. EXAME DE APTIDÃO FÍSICA. DECADÊNCIA. TERMO INICIAL. ATO LESIVO. ART. 18 DA LEI 1.533/51. VIOLAÇÃO NÃO CONFIGURADA. (...) 2. O acordão recorrido alinha-se à jurisprudência do STJ, no sentido de que o prazo decadencial tem início com o ato concreto que prejudica o candidato no decorrer do certame, e não com a publicação do edital. (...) (STJ, AgRg no Resp 1269416, Rel. Min. Herman Benjamin, p. 17/10/2011).
Particularmente, acho correto o posicionamento segundo o qual o prazo decadencial deve ser contado a partir do momento em que a regra do Edital venha efetivamente a prejudicar interesse do candidato, e não a partir da divulgação do Edital, por uma questão de interesse de agir, seja interesse-utilidade, seja interesse-necessidade.
De fato, qual é a utilidade em o candidato impugnar uma cláusula do edital que poderá jamais ser a ele aplicada? Por outro lado, qual seria a necessidade de impugnar tal regra, considerando-se a possibilidade de o candidato não alcançar êxito nas etapas anteriores do concurso e, por conseguinte, sequer chegar ao momento do certame no qual a regra venha a incidir?
Penso eu que a tese de se exigir a impetração do Mandado de Segurança logo da publicação do Edital enseja a propositura de diversas demandas inutéis e desnecessárias, diante de um Judiciário já abarrotado de processos, especialmente devido ao fato de que, em muitas das vezes, o processo fatalmente virá a ser extinto por perda de objeto, ante a desclassificação do candidato em etapa anterior do concurso.
Entendo, além disso, que o posicionamento anterior pode ser refutado por dois outros argumentos, a saber:
O primeiro decorre da aplicação da Súmula 266, STF, pois não é cabível a impetração de MS contra ato normativo em tese, mas apenas contra atos administrativos praticados com base naquele ato normativo. No caso, estar-se-ia a impugnar o ato normativo propriamente dito (Edital), e não o ato a vir a ser praticado com fundamento no ato normativo (Edital).
O segundo argumento consiste no fato de que, ainda que se entenda que, nesses casos, o candidato busca impugnar eventual ato administrativo a ser praticado com respaldo na norma contida no Edital, e não o Edital em si mesmo, seria inaplicável o prazo de 120 dias, posto que se estaria a tratar de Mandado de Segurança preventivo, em relação ao qual não se aplica o prazo decadencial.
RESUMO DA ÓPERA: Segundo o STF, o prazo decadencial de 120 dias para impetração de MS contra cláusulas e regras previstas no Edital do concurso inicia-se a partir do momento em que ela possa ser efetivamente aplicada ao candidato e, portanto, possa ocasionar-lhe prejuízo.
No final, faltou citar decisões do STJ que entendem que não se aplica o prazo de 120 dias, no caso de MS preventivo, tal como o AgR no Resp 1128892, Rel. min. benedito gonçalves, p. 14/10/2010.
ResponderExcluirDe fato, a nova jurisprudência é mais coerente. O edital, por si só, se assemelha a ato normativo em tese, não havendo que se falar em violação pelo simples fato de sua publicação.
ResponderExcluirValeu, Bruno!
Parabéns pela matéria e também pelo blog.
ResponderExcluirAproveito para, se possível, pedir a sua opinião sobre os editais de concurso público que estão exigindo a apresentação de certidões negativas fiscas (União, Estado e Município), como condição para assumir o cargo.
At.
Milton Alexandre Sigrist - RO
Milton, não conhecia esse tipo de exigência em edital de concurso. Acredito, em uma primeira análise, ser absolutamente abusiva, uma vez que os entes públicos têm meios próprios para cobrança de seus créditos, não sendo razoável usar a nomeação para um cargo público como forma indireta de cobrança desses valores.
ExcluirDr. Bruno,
ResponderExcluirO prazo decadencial dos 120 dias do MS que visa anular questão de concurso, começa a correr do gabarito preliminar ou definitivo?
grato,
Aldo Luis
Parabéns pelo texto, utilizei para redigir apelação em mandado de segurança com esse exato tema.
ResponderExcluirBruno, excelente texto: Aplica-se também no caso de prova discursiva fora do edital resultado 10/12/2015 e homologação final do concurso 18/04/2016 ou seja na homologação final se dá o efetivo prejuízo?
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