sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Duas decisões recentes do STF em processo penal


Prezados,

Segue comentário sobre duas decisões do Supremo Tribunal Federal em processo penal.
No primeiro caso, estava em discussão, mais uma vez, o cabimento do Protesto por Novo Juri, revogado em 2008. Qual é o marco temporal a ser considerado para fins de análise do cabimento, ou não, deste recurso? A data do fato ou a data da sentença?
Ratificando o seu posicionamento, o Supremo Tribunal Federal decidiu que, para fins de análise de interposição de recurso penal, deve se considerar a lei vigente à época da decisão a ser recorrida, e não à época do fato criminoso. Portanto, decidiu-se que a matéria recursal é de índole processual, e não penal (ou penal-processual), de modo que, quanto à eficácia da lei no tempo, aplica-se o princípio do tempus regit actum.
Assim, como o Protesto por Novo Júri foi revogado, ele só permanece válido para aquelas condenações proferidas antes da lei que o extinguiu. Para as condenações posteriores, ainda que por fatos ocorridos durante a vigência do recurso, não mais é cabível o Protesto por Novo Júri.
Protesto por novo júri e “tempus regit actum” – INFO 732

A 2ª Turma negou provimento a agravo regimental em que pretendido o cabimento de protesto por novo júri. Na espécie, a prolação da sentença penal condenatória ocorrera em data posterior à entrada em vigor da Lei 11.689/2008, a qual revogara o dispositivo do CPP que previa a possibilidade de interposição do aludido recurso. Reputou-se que o art. 2º do CPP (“Art. 2º. A lei processual aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior”) disciplinaria a incidência imediata da lei processual aos feitos em curso, de modo que, se nova lei viesse a suprimir ou abolir recurso existente antes da sentença, não haveria direito ao exercício daquele. Ressaltou-se inexistir óbice à supressão de recursos na ordem jurídica processual ou à previsão de outras modalidades recursais serem instituídas por lei superveniente, considerado o disposto no artigo em comento e o princípio fundamental de que a recorribilidade reger-se-á pela lei em vigor na data em que a decisão for publicada. Por fim, salientou-se a ausência de amparo legal do pleito, ante a observância do princípio da taxatividade dos recursos.
RE 752988 AgR/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 10.12.2013. (RE-752988)
No segundo caso, estava em discussão os limites da Revisão Criminal em caso de condenação pelo Tribunal do Júri. Em tal hipótese, o Tribunal de Justiça pode, ele próprio, anulando a decisão proferida pelo Júri, analisar o mérito e absolver – ou modificar a pena – do condenado? Ou poderia ele apenas rescindir a decisão e devolver os autos para um novo julgamento pelo Tribunal do Júri?
Vê-se que estão em conflito, em tese, duas garantias constitucionais asseguradas ao réu. De um lado, o Tribunal do Júri, com o seu princípio da soberania dos veredictos. De outro, a revisão criminal, ação autônoma de impugnação manejável apenas pela defesa, inexistindo a denominada revisão em favor da sociedade.
Decidiu o Supremo Tribunal Federal que, rescindindo a decisão do Júri (juízo rescindente), o próprio Tribunal poderá realizar o juízo rescisório e absolver, se for o caso, o condenado, não se limitando apenas a devolver os autos para novo julgamento pelo Júri.
Poder-se-ia argumentar, então, que esse posicionamento violaria a garantia do Tribunal do Júri, posto que o Tribunal de Justiça estaria analisando, em sede de Revisão Criminal, crimes dolosos contra a vida.
Porém, bem analisada a situação, ver-se-á que uma garantia constitucional assegurada ao réu não pode ser interpretada em sentido prejudicial ao próprio réu. Ou seja, a soberania dos veredictos, nesse caso, estaria impedindo que houvesse a prolação de decisão favorável ao réu em sede de outra garantia a ele assegurada.
Dessa forma, a partir da interpretação sistemática das duas garantias – Juri e Revisão Criminal – parece-nos que agiu acertadamente o STF: O Tribunal pode, em Revisão Criminal, efetuar o juízo rescindente, prolatando, de logo, decisão mais favorável ao réu, sem a necessidade de que haja novo julgamento pelo Tribunal do Júri.
Esse é o posicionamento da doutrina majoritária, destacando-se Eugênio Pacelli e Aury Lopes Jr.
Júri - Soberania - Revisão Criminal - Possibilidade (Transcrições) –INFO 728

ARE 674151/MT*


RELATOR: Ministro Celso de Mello

EMENTA: REVISÃO CRIMINAL. CONDENAÇÃO PENAL PELO JÚRI. ERRO JUDICIÁRIO. INOPONIBILIDADE DA SOBERANIA DO VEREDICTO DO CONSELHO DE SENTENÇA À PRETENSÃO REVISIONAL. JULGAMENTO DESSA AÇÃO AUTÔNOMA DE IMPUGNAÇÃO PELO TRIBUNAL DE SEGUNDO GRAU. CUMULAÇÃO DO “JUDICIUM RESCINDENS” COM O “JUDICIUM RESCISSORIUM”. POSSIBILIDADE. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO.
- O Tribunal de segunda instância, ao julgar a ação de revisão criminal, dispõe de competência plena para formular tanto o juízo rescindente (“judicium rescindens”), que viabiliza a desconstituição da autoridade da coisa julgada penal mediante invalidação da condenação criminal, quanto o juízo rescisório (“judicium rescissorium”), que legitima o reexame do mérito da causa e autoriza, até mesmo, quando for o caso, a prolação de provimento absolutório, ainda que se trate de decisão emanada do júri, pois a soberania do veredicto do Conselho de Sentença, que representa garantia fundamental do acusado, não pode, ela própria, constituir paradoxal obstáculo à restauração da liberdade jurídica do condenado. Doutrina. Precedentes.
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