Sabe-se
que é prática comum, atualmente, a convocação de Juízes para atuarem nos
Tribunais, substituindo os seus membros, afastados em razão de férias, licenças
etc...Objetiva-se dar continuidade ao julgamento dos processos, evitando-se um
acúmulo ainda maior de demandas pendentes de resolução.
A
jurisprudência dos Tribunais Superiores, há muito, é uníssona em reconhecer a
legalidade da convocação de Juízes para comporem Turmas ou Câmaras nos
Tribunais, desde que a convocação se dê com base em critérios previstos na
legislação de regência. No caso da Justiça Federal, a Lei que regulamenta a
matéria é a Lei n. 9.788/99.
Contudo,
persistia, até pouco tempo atrás, uma questão bem mais polêmica: Se,
eventualmente, uma Turma ou Câmara fosse composta, majoritariamente, por Juízes
convocados, haveria aí uma violação ao princípio do Juiz Natural, uma vez que,
sob essa ótica, o indivíduo estaria sendo julgado por Juízes de 1º Grau, e não
por Desembargadores?
Inicialmente,
o Superior Tribunal de Justiça adotou entendimento de que, embora possível a
participação de Juízes nos julgamentos dos Tribunais, não seria lícita a
composição do órgão julgador majoritariamente por Juízes convocados. A esse
respeito, cito:
HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. ROUBO TENTADO.
CONDENAÇÃO EM PRIMEIRO GRAU. JULGAMENTO DE RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO PELA DEFESA.
IMPROVIMENTO. ÓRGÃO COLEGIADO. COMPOSIÇÃO MAJORITÁRIA POR JUÍZES CONVOCADOS.
VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. PRECEDENTES. EXCESSO DE PRAZO
CONFIGURADO.
1. Embora não exista impedimento à convocação,
autorizada por lei complementar estadual, de Juízes de primeiro grau para
compor órgão julgador do Tribunal de Justiça, não pode o órgão revisor ser formado
majoritariamente por Juízes convocados, sob pena de violação ao princípio do
Juiz Natural. (...) (STJ, HC 98796, Rel. Min. Laurita Vaz, p. 02/06/08)
No
mesmo sentido, cite-se o AgRg HC 111741.
Entretanto,
avançando na análise do tema, o Supremo Tribunal Federal, e o próprio Superior
Tribunal de Justiça, firmaram posicionamento pela legalidade da situação ora
narrada, chancelando decisões proferidas por órgão julgador de Tribunal
composto, em sua maioria, por Juízes convocados, senão vejamos:
EMENTA: HABEAS CORPUS.
PROCESSUAL PENAL. JULGAMENTO DE APELAÇÃO NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
SÃO PAULO JULGAMENTO. CÂMARA COMPOSTA MAJORITARIAMENTE POR JUÍZES CONVOCADOS.
NULIDADE. INEXISTÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. INOCORRÊNCIA.
ORDEM DENEGADA. I - Esta Corte já firmou entendimento no sentido da
constitucionalidade da Lei Complementar 646/1990, do Estado de São Paulo, que
disciplinou a convocação de juízes de primeiro grau para substituição de
desembargadores do TJ/SP. II - Da mesma forma, não viola o postulado
constitucional do juiz natural o julgamento de apelação por órgão composto
majoritariamente por juízes convocados na forma de edital publicado na imprensa
oficial. III - Colegiados constituídos por magistrados togados, que os integram
mediante inscrição voluntária e a quem a distribuição de processos é feita
aleatoriamente. IV - Julgamentos realizados com estrita observância do
princípio da publicidade, bem como do direito ao devido processo legal, à ampla
defesa e ao contraditório. V - Ordem denegada (STF, HC. 96.821, Rel. Min. Ricardo
Lewandowski, p. 25/06/2010)
Ementa: PENAL. PROCESSUAL
PENAL. CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS. ROUBO QUALIFICADO (ART. 157, § 2º, I E II,
DO CP). COLEGIADO FORMADO MAJORITARIAMENTE POR JUÍZES CONVOCADOS. AUSÊNCIA DE
ILEGALIDADE. FIXAÇÃO DO REGIME INICIAL FECHADO. FUNDAMENTAÇÃO BASEADA NA
OPINIÃO DO JULGADOR SOBRE A GRAVIDADE EM ABSTRATO DO CRIME. MOTIVAÇÃO INIDÔNEA.
SÚMULA Nº 718/STF. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA PARA FIXAR-SE O REGIME INICIAL
SEMI-ABERTO PARA O CUMPRIMENTO DA REPRIMENDA CORPORAL. 1. O julgamento por
Colegiado integrado, em sua maioria, por magistrados de primeiro grau
convocados não viola o princípio do juiz natural nem o duplo grau de
jurisdição. Precedentes: AI 652414-AGR/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ de
17/8/2011; RE 597133/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, Pleno, DJ de 6/4/2011.
2. A Lei Complementar nº 646/1990, do Estado de São Paulo, que ensejou a
convocação dos Juízes que participaram do julgamento cuja nulidade se alega, é
constitucional. Precedentes: HC 96821/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, Pleno,
DJ de 24/6/2010; HC 97886/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 2ªTurma, DJ de
19/8/2010. 3. In casu, o julgamento formalizado pelo TJ/SP se deu perante
Câmara integrada, na sua maioria, por Juízes convocados na forma da Lei
Complementar Estadual nº 646/1990. 4. “A opinião do julgador sobre a gravidade
em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição do regime
mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada” (Súmula 718/STF). 5. No
caso sub judice, o Tribunal de Justiça declinou fundamentação inidônea ao
consignar que “o regime semi-aberto não se mostra compatível com a natureza do
delito, devendo ser estabelecido, para o início de cumprimento de pena, o
fechado”. 6. Parecer do MPF pela concessão parcial da ordem para fixar-se o
regime inicial semiaberto. 7. Ordem concedida para deferir-se o regime inicial
semiaberto para o cumprimento da pena privativa de liberdade (STF, HC 100211,
Rel. Min. Luiz Fux, p. 04/10/2011)
HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. JULGAMENTO DO
RECURSO DE APELAÇÃO REALIZADO POR CÂMARA FORMADA MAJORITARIAMENTE POR JUÍZES DE
PRIMEIRO GRAU CONVOCADOS. OFENSA AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. INOCORRÊNCIA.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM DENEGADA.
1. Em recente julgamento o Plenário do Supremo
Tribunal Federal entendeu que os julgamentos de recursos proferidos por Câmara composta,
majoritariamente, por juízes de primeiro grau não são nulos, tendo em vista que
não violam o postulado constitucional do juiz natural.
2. Ordem denegada (STJ, HC 165969, Rel. Min. Marco Aurélio
Bellizze, p. 20/10/2011)
Essa
orientação concede grande relevância à garantia da duração razoável do processo
e o princípio da celeridade da prestação da tutela jurisdicional, refutando a
suposta ofensa ao princípio do Juiz Natural, seja porque a convocação é feita
de forma genérica, para julgamento de todos os processos, e não de apenas esse
ou aquele, além de obedecer critérios objetivos definidos na legislação; seja
porque, enquanto estiverem atuando no Tribunal, os Juízes de 1º Grau atuam como
verdadeiros Desembargadores, exercendo todas as prerrogativas inerentes ao
cargo, sem que seja possível, na nossa visão, criar uma distinção entre
Desembargador e Juiz Convocado. O voto do Juiz Convocado tem a mesma força do
voto do Desembargador Decano do Tribunal...
RESUMO
DA ÓPERA: É lícita a convocação de Juízes para atuarem em Tribunais, atendidos
os requisitos legais, sendo admissível, inclusive, que o órgão julgador do
Tribunal seja composto predominantemente por Juízes convocados.