A entrevista reservada entre réu e defensor encontra
previsão legal no art. 185, §5º, CPP c/c art. 7º, III, EAOAB, configurando-se
concretização do direito à ampla defesa, justamente por permitir o contato entre
a autodefesa e a defesa técnica.
Em nossas audiências criminais envolvendo múltiplos réus, não é incomum que um dos defensores peça para ter entrevista reservada com seu cliente no interstício compreendido entre o término do interrogatório de um ou mais de um réu e o início de seu interrogatório. Por exemplo, no caso de três corréus, imagine-se a hipótese do advogado do último réu, que acompanhou o interrogatório dos dois primeiros réus, reivindicar a entrevista prévia com seu cliente antes do interrogatório.
Seria possível conceder tempo para a entrevista pessoal
se outros réus já foram interrogados na presença do defensor técnico do réu que
ainda irá depor? Ou, noutro sentido, ofenderia a ampla defesa e as
prerrogativas do defensor indeferir o pedido de entrevista pessoal nestas
circunstâncias?
O tema ganha relevância em razão da previsão legal de que
os interrogatórios são incomunicáveis, isto é, o réu que ainda irá depor não
pode acompanhar os interrogatórios antecedentes (art. 191, CPP). Diante deste
cenário, como equalizar, de um lado, o direito à entrevista prévia, e, de
outro, a incomunicabilidade dos interrogatórios?
Antes
de emitir a nossa opinião, pensamos ser válido mencionar, por oportuno, que a regra da
entrevista prévia era, até pouco tempo atrás, de suma importância para a garantia
da ampla defesa do réu, haja vista que o interrogatório consubstanciava o
primeiro ato instrutório do procedimento penal. Com efeito, até o advento da Lei
n. 11.900/2009, o réu era citado para comparecer em Juízo e ser interrogado. Nesse
passo, era bastante comum que o primeiro contato entre o réu e o defensor
ocorresse no momento do próprio interrogatório, sobretudo quando se tratava de
defensor público ou defensor dativo.
Assim
sendo, a entrevista pessoal era a oportunidade única de interação entre a
autodefesa e a defesa técnica, permitindo, de um lado, que o réu fosse
informado a respeito do que seria o interrogatório, seus direitos e garantias
(dentre eles, o direito ao silêncio), assim como, de outro lado, que o defensor
técnico pudesse conhecer o interrogando e saber qual o fato a ser interrogado,
a fim de estabelecer a melhor estratégia defensiva.
Entretanto,
após a citada alteração legislativa, o interrogatório passou do início para o
final do procedimento, de modo que, atualmente, o réu é citado para apresentar resposta
à acusação, o que pressupõe o contato prévio com o seu defensor técnico
constituído. Além disso, entre a resposta à acusação e a audiência de instrução
e julgamento, na qual será interrogado, passam-se meses ou até anos, sendo
certo que durante todo este período o réu e o seu defensor tem totais condições
de manter contato entre si.
Como
se não bastasse, no próprio dia da audiência, o contato poderá ser
absolutamente mantido antes de seu início, assim como durante todos os atos
instrutórios que antecedem o interrogatório, especificamente o depoimento
pessoal do ofendido e os depoimentos das testemunhas.
Não
desconhecemos a particularidade da defesa realizada por defensores públicos ou
dativos. Em que pese a dificuldade – ou impossibilidade – de contato por
ocasião da apresentação da resposta à acusação, não há dúvidas de que a
entrevista prévia poderá, pelo menos, ser realizada antes do início da
audiência, bem como poderão, defensor e réu, manter contato durante o curso do
ato processual.
Fincadas
tais premissas, a nosso sentir, a melhor solução é conceder prazo para a
entrevista pessoal dos defensores com os réus após o término das oitivas das
testemunhas e antes do início da fase de interrogatório.
Em
outras palavras, finalizada a inquirição das testemunhas arroladas pelo MP e
pela defesa, o Juiz deve comunicar aos defensores que dará início aos
interrogatórios, questionando-lhes se precisam de concessão de prazo para o
contato prévio entre eles e seus clientes. Tal medida, além de assegurar o direito
à entrevista prévia, não torna inócua a regra da incomunicabilidade entre os
interrogatórios.
Seria
indisfarçável ingenuidade imaginar outra intenção no interesse do advogado em
conversar com seu cliente após ter acesso ao conteúdo dos interrogatórios dos
corréus senão a de transmitir-lhe o que ocorreu durante estes interrogatórios, permitindo
que um interrogatório influenciasse nos demais, nada obstante o teor do art. 191,
CPP e o caráter de meio de prova do interrogatório (embora também seja
considerado meio de defesa), bem como criando uma desigualdade de armas dentro
do próprio polo defensivo, visto que o réu a ser interrogado por último teria a
possibilidade de saber os que corréus disseram, enquanto, p.ex, o primeiro
corréu a depor não teria esta oportunidade.
Compartilho do mesmo entendimento. Parabéns pelo texto!
ResponderExcluirExcelente entendimento. Não se vê tal discussão relevante nos manuais de processo penal. A proposta data no texto é a que melhor se coaduna com a persecução penal e as garantias individuais.
ResponderExcluir