domingo, 11 de março de 2012

Mandado de Segurança, STJ e a teoria da encampação


O Mandado de Segurança é impetrado em face da denominada autoridade coatora, autoridade responsável pela prática do ato supostamente ilegal e abusivo. Muito se discute sobre a legitimidade passiva. Se seria da própria autoridade coatora ou da pessoa jurídica a quem ela pertença. Não vamos nos aprofundar nesse debate. A nossa opinião, contudo, é de que a legitimidade passiva é da autoridade coatora, e não da pessoa jurídica, pois, se assim fosse, não haveria razão para que esta fosse notificada para, querendo, integrar a lide. Ela integraria através da citação, necessária.

De toda forma, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a indicação errônea da autoridade coatora (ou seja, se o MS foi impetrado em face da autoridade coatora errada), enseja a extinção do processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, VI, CPC.

Mas a própria jurisprudência do STJ criou uma exceção à regra da extinção do processo sem resolução do mérito no caso de erro na indicação da autoridade coatora, qual seja, a aplicação da teoria da encampação, senão vejamos:

Basicamente, segundo a citada teoria, reconhece-se que a autoridade coatora apontada equivocadamente possa prestar as informações e integrar a relação jurídica no lugar da autoridade coatora correta, desde que presentes 3 requisitos, quais sejam:


1º Requisito: A autoridade coatora apontada, com erro, pelo impetrante deve ser hierarquicamente superior àquela autoridade que seria a correta;

2º Requisito: A autoridade coatora apontada, por equívoco, pelo impetrante deve defender a legalidade do ato impugnado, não sendo aplicável a teoria na hipótese de a autoridade coatora apenas suscitar o erro na sua indicação;

3º Requisito: A indicação da autoridade coatora errada, ao invés da autoridade coatora legítima, não pode acarretar a modificação da competência absoluta para julgamento do MS.

Quanto a este último requisito, mencione-se, por exemplo, que a Constituição do Estado de Pernambuco prevê a competência do TJPE para julgar, originariamente, MS contra Prefeito. Já o MS contra ato de Secretário Municipal é julgado pelo Juiz de 1º grau. Assim, se o MS é impetrado contra o Prefeito, por equívoco, quando deveria ter sido impetrado contra o Secretário, ainda que o Prefeito defenda o ato, e seja hierarquicamente superior ao Secretário, não será aplicável a teoria, pois haveria alteração da competência para julgamento.

Nesse sentido, citem-se:

TRIBUTÁRIO. PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. AUTORIDADE COATORA. LEGITIMIDADE. ISS. EMPRESA PRESTADORA DE TRABALHO TEMPORÁRIO. BASE DE CÁLCULO QUE ABRANGE, ALÉM DA TAXA DE AGENCIAMENTO, OS VALORES RELATIVOS AO PAGAMENTO DOS SALÁRIOS E ENCARGOS SOCIAIS REFERENTES AOS TRABALHADORES CONTRATADOS PELA "EMPRESA DE TRABALHO TEMPORÁRIO". 1. É aplicável a teoria da encampação em casos de mandado de segurança sempre que, cumulativamente, estiverem cumpridos os seguintes requisitos: (i) discussão do mérito nas informações; (ii) subordinação hierárquica entre a autoridade efetivamente coatora e a apontada como tal pela inicial e (iii) inexistência de modificação de competência. (...) (STJ, Resp 1185275, Rel. Min. Mauro Campbell, p. 23/09/11)
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSUAL CIVIL. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO SECRETÁRIO DE ESTADO. TEORIA DA ENCAMPAÇÃO. INAPLICABILIDADE. MODIFICAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADUAL. 1. O Secretário de Fazenda do Estado de Pernambuco é parte ilegítima para figurar no polo passivo de mandado de segurança em que se discute auto de infração lavrado em decorrência do não pagamento de ICMS. 2. "A teoria da encampação é aplicável ao mandado de segurança tão-somente quando preenchidos os seguintes requisitos: (i) existência de vínculo hierárquico entre a autoridade que prestou informações e a que ordenou a prática do ato impugnado; (ii) ausência de modificação de competência estabelecida na Constituição Federal; e (iii) manifestação a respeito do mérito nas informações prestadas." (REsp nº 818.473/MT, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, in DJe 17/12/2010). 3. Inaplicabilidade da teoria da encampação, pena de ampliação indevida da competência originária do Tribunal de Justiça, que não abrange a competência para julgar mandado de segurança impetrado em face de ato do Diretor de Administração Tributária. Precedentes. 4. Agravo regimental improvido (STJ, AgRg no RMS 33189, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, p. 24/02/11)
RESUMO DA ÓPERA: O STJ aplica, ao caso de MS impetrado contra autoridade coatora errada, a teoria da encampação, admitindo o prosseguimento do MS no caso de a autoridade correta ser hierarquicamente superior àquela apontada pelo impetrante; que a autoridade coatora defenda o ato impugnado; e, que não haja modificação da competência para julgamento do MS.

 

9 comentários:

  1. Bruno, a teoria caiu na prova PFN agora (questão 88). A questão apontou, inclusive, os 3 requisitos supramencionados por você. Valeuzão! :)

    ResponderExcluir
  2. para levar a discussão em recurso especial, qual seria o artigo tido por violado?

    ResponderExcluir
  3. "Resumo da ópera: O STJ aplica, ao caso de MS impetrado contra autoridade coatora errada, a teoria da encampação, admitindo o prosseguimento do MS no caso de a autoridade correta ser hierarquicamente superior àquela apontada pelo impetrante". Não seria o contrário?

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Perfeita observação, Leandro. A autoridade coatora APONTADA ERRONEAMENTE deve ser sempre hierarquicamente superior à autoridade correta correta.

      Excluir
  4. Não, Leandro Barbosa, é exatamente o que você disse no início, por atendimento ao princípio vinculativo federativo do "ad maioris, ad minus", ou seja, de "quem pode o mais, pode o menos". Seria desarrazoado pensar em um ente hierarquicamente inferior,poder abarcar funções de um hierarquicamente superior, sem delegação, principalmente em se tratando de assumir ato manifestamente violador de direito líquido e certo. A adequação do instituto da encampação ao MS daria margem à imposição arbitrária do superior hierárquico em desfavor do subordinado a assumir atos praticados por eles mesmos, em desfavor, justamente, do menos favorecido na relação funcional.

    Bruno, parabéns pelo trabalho elucidativo. Estou usando-o como material para pesquisa e elaboração de artigo científico. Grata.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Creio que você não tenha entendido o posicionamento do colega. Leandro Barboza está certo, a autoridade coatora errada deve ser hierarquicamente superior à suposta autoridade coatora correta, não apontada.

      Excluir
  5. Vejam esse julgado-AgRg nos EDcl no RMS 33770 / PE- bem o exemplo que o Bruno descreve.

    ResponderExcluir
  6. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  7. Muito obrigada, professor! Excelente explicação!

    ResponderExcluir