sábado, 17 de maio de 2014

STJ e o princípio da serendipidade. Descoberta fortuita de prova x descumprimento do objeto da busca e apreensão



Você já ouviu falar em princípio da serendipidade? Eu, depois de vários anos estudando para concurso público e sempre tendo gostado de processo penal, nunca tinha ouvido falar neste princípio citado em recentíssima decisão do STJ, a saber:


DIREITO PROCESSUAL PENAL. DESCOBERTA FORTUITA DE DELITOS QUE NÃO SÃO OBJETO DE INVESTIGAÇÃO. O fato de elementos indiciários acerca da prática de crime surgirem no decorrer da execução de medida de quebra de sigilo bancário e fiscal determinada para apuração de outros crimes não impede, por si só, que os dados colhidos sejam utilizados para a averiguação da suposta prática daquele delito. Com efeito, pode ocorrer o que se chama de fenômeno da serendipidade, que consiste na descoberta fortuita de delitos que não são objeto da investigação. Precedentes citados: HC 187.189-SP, Sexta Turma, DJe 23/8/2013; e RHC 28.794-RJ, Quinta Turma, DJe 13/12/2012. HC 282.096-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 24/4/2014.


Mas, na verdade, apesar da alusão a este nome complicado, trata-se de sinônimo de descoberta fortuita de provas.
É comum que, p.ex, no cumprimento de uma busca e apreensão em uma residência, a Polícia identifique indícios da prática de outros crimes (armas, documentos falsos, drogas etc...), sem qualquer relação com o crime investigado e objeto da ordem judicial.
Em tais casos, é plenamente válida a apreensão desses elementos (e, até mesmo, o flagrante delito), com o desencadeamento da investigação e do processo penal, pois a descoberta ocorreu no cumprimento normal da ordem judicial, não sendo possível simplesmente ignorar a flagrância ou os indícios de crime.
Porém, é preciso ter cuidado para não confundir descoberta fortuita com busca alheia ao objeto da ordem judicial. Explico, com um exemplo bem singelo.
Imagine que a busca é por drogas. Neste caso, se olhando uma gaveta, a polícia encontra uma arma, é descoberta fortuita, perfeitamente legítima. Porém, se a autoridade liga o computador e passa a examinar os seus arquivos, vindo a descobrir indícios de outros crimes, esta prova será ilícita, haja vista que não se tratou de descoberta fortuita, mas sim de efetivação de busca fora dos parâmetros e objetivos da ordem judicial deferida.